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Um retrato triste de um lindo vale

1 Janeiro (79)1 Janeiro (81)

Os que apostam que o Rio Grande do Norte não tem história interessante a ser contada podem jogar mais fichas sobre a mesa e sair contando vitória, porque o que se fez e o que se faz, com fatos, monumentos e personagens históricos, não permite outra leitura. – Duvida? – Pois então bote um par de alpercatas nos pés e saia batendo pernas pelas veredas potiguares e tire a prova dos nove. Se quiser traçar um rumo comece pelo começo, indo até a Praia do Marco, onde foi chantado o Marco de Posse, em 1501. Em seguida vá até o Cabo de São Roque, litoral do munícipio de Barra do Maxaranguape e de lá pegue descendo até se deparar com as grossas paredes do Forte dos Reis Magos, na foz do Rio Potengi, em plena capital potiguar. – E depois? – Depois, se você não ficar entristecido com o que viu, passe em qualquer banca de revista e compre um roteiro turístico de bolso e vá em frente com muita fé, pois se tiver fé de menos você desiste no meio do caminho. Os acostamentos dos caminhos que tentam contar a história das terras de Poti são lastimosos.

1 Janeiro (74)1 Janeiro (76)

Dia desses fui a praia de Muriú, litoral Norte, e após uma noitada de bons papos e vinhos, na casa de um amigo, pela manhã retornei a Enxu Queimado, porém, em vez de pegar a BR 101 até o município de Touros, seguir para São Miguel do Gostoso e de lá trafegar no arremedo de estrada vicinal até Enxu, decidi seguir pela antiga estrada que liga Muriú a sede do município de Ceará Mirim, pegar a BR 406 até João Câmara, e de lá seguir pela RN 120 até Pedra Grande e daí mais uma vez me indignar nos 11 quilômetros de descaso que é a estrada entre Pedra Grande e Enxu. Aliás, se a estradinha de Enxu recebesse apenas uma lasquinha das verbas públicas que ultimamente vem sendo gasto com festas e shows, se não desse para asfaltar, chegaria bem perto disso.

1 Janeiro (73)1 Janeiro (89)

Pois bem, voltemos ao Vale do Ceará Mirim. Havia anos que não andava naquela estrada que outrora serviu de único acesso a bela praia de Muriú e que sempre me encantou, devido a beleza dos engenhos e pelo magistral casario que engendrava a cena canavieira em um mundo emoldurado por uma áurea de fascínio e lamentos de uma riqueza histórica que, já naquele tempo, pedia socorro para não ser esquecida em algum recanto do futuro, e foi.

1 Janeiro (87)

Dos grandes engenhos praticamente nada restou e a história agoniza em meio ao abandono e escombros fantasmagóricos. Placas enferrujadas indicam a existência de um certo Caminho dos Engenhos, roteiro turístico do Governo do Estado, mas diante do que está posto, duvido muito que ainda exista algum documento da criação ou mesmo que normatize o tal programa. Ora, se o Marco de Touros, o Cabo de São Roque, a Fortaleza dos Reis Magos, pedra fundamental da capital potiguar, estão jogados ao deus dará, imagine uns engenhos de cana de açúcar, símbolos da aristocracia, localizados em um município interiorano de médio porte!

1 Janeiro (90)

Com muita justeza e propriedade alguém ira alegar que não foi apenas o Rio Grande do Norte que jogou a história na lata do lixo. Claro que não, porque isso é um mal que sempre se viu em toda parte desse Brasil desvairado e eternamente mergulhado no caos, mas apesar de tudo fiquei feliz, mesmo diante da desilusão, em voltar a trafegar pela velha estrada de Muriú, que pelo estado em que se encontra, parece ter recebido recentemente uma fina camada de lama asfáltica, porém, esqueceram os acostamentos e a sinalização, e indicarei o caminho para todos que queiram saber um pouco mais sobre o esquecido Rio Grande do Norte, um Estado lindo, mas tão cruelmente maltratado e dilacerado pelos seus governantes.

Nelson Mattos Filho

Todo dia é dia de Índio

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A imagem do recorte da Revista da Semana, datado de 1956, é uma relíquia e conta uma pontinha da viagem de Américo Vespúcio, como encarregado de  relatar tudo o que viu, ouviu e sentiu a bordo da frota comandada pelo navegador André Gonçalves, em 1501, pelas novas terras descobertas por Cabral. A tragédia – para os colonizadores invasores –, se deu em um jogo de sedução – pois é, jogo de sedução –que as índias fizeram com os homens que vinham do mar. A matéria do velho semanário brasileiro conta que o quiprocó se deu no Cabo de São Roque/RN, mas já li o mesmo fuzuê como tendo acontecido na Praia do Marco, também litoral potiguar, onde foi chantado o primeiro marco de posse pelos marujos de André Gonçalves. Pelo menos é assim que conta o historiador Lenine Pinto. Ali ou acolá, o que importa é que as indiazinhas mandaram ver nos trejeitos libidinosos e atraíram a marujada, que há tempos não saboreavam da fruta. Os dois que primeiro chegaram a praia, foram comidos, literalmente, depois de assados numa fogueira. O outro, que foi a procura dos primeiros, e louco de desejo, teve o mesmo fim ali mesmo na praia, e enquanto saboreavam nacos de carnes do infeliz, as índias mostravam os pedaços para os que ficaram embarcados e faziam gestos que, se desembarcassem, teriam o mesmo fim. Vespúcio anotou tudinho em seu caderno e a flotilha seguiu em frente em busca de índios mais amigos. Hoje índio faz isso não, e se fizer, a borracha come no costado, pois desde os tempos do descobrimento que aprendemos a não dar valor, nem vez, ao povo da floreta. Quarta-feira, 19 de abril, foi comemorado o Dia do Índio e com certeza esse almoço antropófago não foi comentado em nenhuma rodada filosófica, pois os filósofos tupiniquins estão ocupados demais em escrever teses mirabolantes para defender certos caciques. Uma nota para encerrar: A Revista da Semana circulou no Brasil entre 1900 a 1962 e foi fundada por Álvaro de Teffé. Isso mesmo, filho do Barão. Fonte da imagem: Eduardo Alexandre Garcia.                 

Uma viagem para poucos – II

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O título dessa série de crônicas me veio em mente num dos piores momentos da navegada entre Fortaleza/CE e Cabedelo/PB, enquanto cruzávamos o Cabo de São Roque, no litoral do Rio Grande do Norte. Naquele momento pensei no livro, Uma Viagem para Loucos, que conta os primórdios de uma das regatas mais famosas do mundo e que tem como objetivo cruzar os mais tenebrosos cabos, enfrentando os mais temerosos mares, e fiquei matutando em como aqueles homens, velejando em solitário, eram valentes e valorosos com o pouco que dispunham em seus veleiros.

Lógico que nem de longe estávamos enfrentando o desafio daqueles velejadores que se tornaram lenda e referência para o mundo da vela, e nem em sonho tenho a intenção e nem o egoísmo de me tornar um deles, pois meu voo é baixinho como o de um anum. Porém, aquele mar do litoral potiguar me instigou os sentidos e me deixou a cada onda que vencíamos mais alerta.

Mas antes de prosseguir na narrativa, quero pedir um pouco de paciência aos leitores que apenas amam o mar e embarcam comigo semanalmente nas páginas desse Diário, para poder dar alguns detalhes técnicos do catamarã Argos III, o grande guerreiro dessa história, porque a turma de velejadores e afins, que também nos acompanha, implora aos quatro ventos. Continuar lendo

O Farol e a história

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Não se atenha na falta de enquadramento da foto com o horizonte deixando o mar escorrer para a esquerda, isso são percalços que acontecem na vida de qualquer imitador de dublê de fotografo amador, pois o que eu quero mostrar mesmo é essa estrutura nas cores branca e vermelha. Esse é o Farol de Cabo de Roque, localizado no Cabo de São Roque, município de Barra de Maxaranguape/RN. Lógico que todo mundo deve saber o que eu vou dizer, mas em todo caso vou dizer assim mesmo: O Cabo de São Roque é o ponto do continente brasileiro mais próximo do continente africano, reparem que falei continente brasileiro. Foi desse ponto do litoral que o explorador português André Gonçalves e o navegador Américo Vespúcio, deram início a primeira exploração detalhada da costa do Brasil, mas eles não navegaram direto de Portugal para esse ponto, se fosse hoje era waypoint. A expedição da declarada exploração, naquele tempo não existia Direitos Humanos, era composta de três Naus e deram com os costados na Latitude 5º3’41”, naquele tempo os homens não conheciam o que danado era a tal da Longitude que vivia martelando na cabeça dura deles. Pois é, as três Naus trazendo nossos exploradores ancoraram em plena Praia do Marco, bem longe de Porto Seguro/BA, no dia 7 de Agosto de 1501. E para quem não sabe, essa data foi oficializada pelos explorados para se comemorar o aniversário do estado do Rio Grande do Norte. Mas e o Cabo de São Roque? Bem, o Cabo fica 45 milhas ao Sul de onde os cabras da peste ancoraram e marcaram território com um Marco de Posse, uma pedra calcária, medindo 1,20 metros de altura e com a Cruz da Ordem de Cristo e  as armas do Rei de Portugal gravadas em alto relevo. Posse é posse! Mas, vamos voltar ao Cabo de São Roque: Depois da posse, os portugueses saíram num contravento dos diabos em pleno mês de Agosto, e ainda tem amigo afirmando que aqueles barcos não orçavam, somente na vela e chegaram no Cabo, local em que a história segue o rumo, navegando entre contos, conversas desencontradas, mentiras e verdades verdadeiras. Muitos anos depois a Marinha do Brasil construiu o Farol de São Roque, uma estrutura de vigas de concreto armado e alvenaria, com 50 metros de altura, pintado com faixas horizontais encarnadas e brancas, com alcance visual luminoso de 21 milhas e geográfico de 17 milhas. Esse é o Farol que você avista na foto acima e que se um dia você passar por lá, não esqueça que o Brasil, segundo o que está escrito nos anais da história, começou a ser mapeado por ali. E ainda posso dizer que o Cabo de São Roque é um dos mais belos recantos do litoral potiguar.